Antes que Belém receba líderes e ambientalistas de todo o mundo na COP30, as montanhas de Minas já começaram a ecoar as conversas que importam. No alto da serra, o Ibiti Projeto abriu espaço para uma imersão rara: quatro dias de diálogos e vivências com Paul Watson, fundador da Sea Shepherd e um dos ativistas ecológicos mais radicais e influentes do planeta.
Entre refeições veganas e rodas de conversa em cenários simbólicos do Ibiti — como as Estátuas, a Oca, o Café Gaia e a Praia do Mogol —, Watson defendeu uma mudança profunda de paradigma: abandonar a visão antropocêntrica, que coloca o ser humano no centro de tudo, e adotar um olhar biocêntrico, que reconhece a interdependência entre todas as formas de vida.
“Há milhares de anos vemos o mundo de um ponto de vista antropocêntrico, como se tudo fosse sobre nós, como se fôssemos a única espécie que importa. Mas nós somos apenas parte de um todo. As espécies com as quais compartilhamos o planeta são mais importantes que nós, porque podem viver sem nós, seres humanos, e nós não podemos viver sem elas. Dependemos dos insetos, das árvores, dos pássaros, do fitoplâncton e do zooplâncton para a nossa própria sobrevivência”, disse Watson durante o encontro.
Com seu tom direto e provocador, o capitão, que há mais de cinco décadas navega mares em defesa da vida marinha, transformou o Ibiti em um porto simbólico, onde o oceano encontrou as montanhas e o ativismo se misturou à contemplação.
Ao lado da navegadora Tamara Klink e sua mãe, Marina Klink, do cineasta Gert-Peter Bruch (Planète Amazone), de Nathalie Gil (presidente da Sea Shepherd Brasil) e de outros nomes engajados com a causa, Watson participou de diálogos que abordaram ética global, biocentrismo e as velhas novas formas de coexistência com o planeta.


Cultura, ética e o limite da tradição
Em uma das conversas, Tamara Klink questionou o uso da palavra “cultura” como justificativa para práticas como a pesca. “Muitos argumentam que a caça e a pesca fazem parte da cultura local. Mas quando esses povos já têm acesso a alternativas, como supermercados e outras fontes de alimento, até que ponto a cultura pode justificar a destruição?”, perguntou Tamara.
Watson respondeu sem hesitar: “A cultura não pode justificar a crueldade. Não pode justificar a destruição ecológica. Este é o século XXI, não precisamos mais disso. Os britânicos não precisam mais de caçar raposas, os espanhóis não precisam mais das touradas. Nada pode ser justificado pela cultura quando envolve sofrimento e morte desnecessária.”
Um encontro antes das cúpulas
O evento, realizado entre 31 de outubro e 3 de novembro, foi um ensaio sobre um novo paradigma ecológico, que nasce não de conferências e discursos oficiais, mas do encontro entre pessoas que vivem o que defendem, como é o caso do grupo que se reuniu no Ibiti, com destaque para os sócios da marca NaVeia, envolvida no apoio e na organização do evento.
Entre um café no Gaia e uma conversa à beira da Praia do Mogol, emergiram ideias que questionam não apenas o ativismo, mas o próprio sentido de estar vivo. A ética, a arte e a natureza se fundiram na música mineira tocada ao violino e sanfona durante o jantar na Oca, na exibição de filme no Cine Mazzaropi e no cortejo das crianças da Life School pelas ruas da Vila Mogol: um lembrete de que o futuro também se educa pelo exemplo.
Para o Ibiti Projeto, que vem se consolidando como um território de regeneração e liberdade, o encontro reforçou sua vocação: ser um espaço de escuta e experimentação, onde o diálogo entre o ser humano e o planeta pode ser refeito.

Sem azul, não há verde
O lema “Sem azul não há verde”, que será levado pela Sea Shepherd à agenda da COP30, também encontrou eco no Ibiti. A frase resume a essência do movimento que defende a interdependência entre oceanos e florestas, lembrando que a saúde do planeta começa pelo equilíbrio entre água e vida.
A campanha ganhou destaque nacional quando a coalizão SOS Oceano (que reúne organizações como a Sea Shepherd Brasil) lançou, em parceria com a agência Droga5, uma versão da bandeira do Brasil sem a cor azul, simbolizando a crise marinha. A iniciativa, apresentada durante a Rio Ocean Week, alerta para o colapso dos ecossistemas aquáticos e reforça a meta global de proteger 30% dos oceanos até 2030.
Água é vida
Inspirado pela presença de Watson, o Ibiti Projeto instalou uma placa simbólica na Praia do Mogol, reafirmando seu compromisso com a vida e as águas que nascem ali:

Compromisso do Ibiti com o Oceano
Aqui, onde nascem os rios, reconhecemos que o oceano começa: das nascentes da Bacia do Paraíba até o Rio da Prata e além.
Em homenagem ao Capitão Paul Watson, guardião do mar, comprometemo-nos a cuidar destas águas para que elas cheguem ao oceano puras, vivas e livres.
“Inteligência é a capacidade de uma espécie viver em harmonia com o seu ambiente”
Capitão Paul Watson
Um chamado à ação
Entre reflexões profundas e gestos simbólicos, o encontro no Ibiti deixa um lembrete poderoso: a regeneração do planeta começa dentro de cada um de nós.